terça-feira, junho 16, 2009

Duas vidas...

Essa semana estava assistindo novamente na TV o filme "Into the Wild", que no Brasil foi traduzido como "Na Natureza Selvagem", o que na minha opinião não faz juz ao significado do nome em inglês. Explico. O nome em inglês não faz menção somente ao fato de o personagem estar solto na natureza selvagem, mas sim solto por completo dentro da sociedade, corpo e mente, como um animal que corre livre na vida, desligado de qualquer prisão financeira ou emocional com o mundo, com as pessoas e com os conceitos.

Deixando à parte a opinão pessoal de cada um quanto à verdadeira essencia do personagem principal, o filme em si é muito bom. Como experiência cinematográfica e como experiência de vida, que se coloca em prática enquanto você está na sala do cinema. A história cresce, os personagens são verdadeiros e humanos, e todos se transformam, nada permanece da maneira que começou.

Falando de cinema a experiência é completa. A trilha sonora é perfeita, a fotografia é transcendental, os personagens são reais; vivem, respiram e crescem.

Eu sei que a minha experiência em Atlanta, a cidade em que Alexander Supertramp vive no começo do filme entre livros e angústias num apartamento minúsculo, me fez muito mais próxima da história. O começo do filme me transportou para o meu apartamento minúsculo na mesma cidade, sozinha com os meus livros. Quem chega por aqui nestas condições entende das glórias e dos martírios que uma cidade tão solitária traz para a cabeça daqueles que sonham demais.

Em um momento da história Alexander Supertramp diz que se aceitarmos que a vida deve ser regida somente pela razão, então toda a possibilidade de vida estaria automaticamente destruída. Se a vida tivesse que ter um significado, e as escolhas que fazemos tivessem que ter um porquê, trilhar um determinado caminho perderia todo o sentido. Pois a grande aventura de uma jornada é sentir a liberdade de seguir adiante sem saber direito o "porque" pré estabelecido ou o que vem a seguir. E aí sim sentir o novo a todo momento, pois este é o principal alimento da raça humana.

Em um outro momento ele afirma que nesta vida mais vale se sentir forte do que ser forte. E em um trecho do filme ele encara a si mesmo pela janela de um bar em Los Angeles. Ele vê através do vidro a sua outra vida, o que ele seria se tivesse escolhido um caminho diferente. De alguma forma engraçada a vida coloca essa piadinha sem graça de tempos em tempos no nosso caminho, onde temos que enfrentar as escolhas que fizemos e comparar a nossa vida atual com a outra vida, a passada. E as duas vidas ficam cara a cara naquele instante, aquela que rejeitamos no passado quando escolhemos um caminho diferente aparece para cobrar o preço da escolha.

E assim segue o filme, um emaranhado de filosofia, cinema e literatura. E no desfecho a beleza da lição aprendida. Depois de tantos tapas na cara a cada linha do roteiro, a cada desprendimento do personagem a tudo e a todos, Sean Penn (o diretor e o roteirista) e Jon Krakauer (o escritor do livro) nos apresentam a maior de todas as lições que Alexander Supertramp tirou dessa vida, e nós, graças a eles, tiramos na sala do cinema: felicidade só é real se é dividida com alguém.

Existem sempre duas vidas na nossa história, aquela que vivemos: passado e presente, e aquela outra do "e se" que nunca vamos saber ao certo onde daria. Mas essa é uma das trágicas magias da jornada de cada personagem nesse mundo tão grande, onde tudo está sempre tão perto e tão longe.

Eu ando conversando muito com o Alexander Supertramp que existe dentro de mim. Tentando decidir que rumo seguir depois desse tanto divagar, esperar, estudar, ler, sentir e sofrer. Mas as duas vidas que se apresentam na minha frente ainda continuam confusas, nebulosas e distantes.

"Algumas pessoas acreditam que não merecem o amor, e por isso elas andam no silêncio dos espaços vazios, tentando fechar os buracos do seu passado". Quem sabe seja isso. Ou quem sabe sejam as eternas perguntas de sempre: quem somos? o que fazemos? pra onde vamos? Ou ainda quem sabe seja mesmo que o amor por todas as coisas desse mundo não é um sentimento, mas uma habilidade. E nós estamos sempre tentando aprender, não importa em qual das duas vidas.

Filme do dia_"Into the Wild" by Sean Penn
Música do dia_"Rise" by Eddie Vedder
Frase do dia_ "Rather than love, than money, than faith, than fame, than fairness... give me truth". Thoreau

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